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C9 - Enriquecimento sem causa


89. Requisitos
Para que haja enriquecimento sem causa (arts. 473º segs. CC) é preciso que haja uma deslocação patrimonial, isto é, que haja uma transferência patrimonial do património de alguém para o património de alguém para o património de outrem.
Para que se aplique o regime do enriquecimento sem causa, é preciso que a situação assim tipificada tenha ocorrido, mas é preciso mais: é preciso que não seja aplicável a essa situação um qualquer outro regime jurídico, ou que a lei não recuse a restituição do enriquecimento ao empobrecido.
O carácter subsidiário do instituto do enriquecimento sem causa, é condição de aplicabilidade nos termos referidos, existe quando a lei não atribui outros efeitos à deslocação patrimonial, quando não há outro regime aplicável, quando a lei não nega o direito à restituição daquilo que foi recebido pelo enriquecido.
A obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa ou locupletamento à custa alheia pressupõe a verificação cumulativa de três requisitos:
a) É necessário, que haja um enriquecimento;
b) O enriquecimento, contra o qual se reage, careça de causa justificativa;
c) A obrigação de restituir pressupõe, que o enriquecimento tenha sido obtido à custa de quem requerer a restituição.
Para que haja lugar à obrigação de restituir é necessário, ainda, que o enriquecimento tenha sido obtido imediatamente à custa daquele que se arroga o direito à restituição.
O enriquecimento sem causa, assim como dá lugar à obrigação de restituir no caso de a atribuição patrimonial se haver já consumado, também pode servir de fundamento a uma excepção contra o enriquecimento injusto, se a atribuição não tiver sido ainda realizada e for exigido o seu cumprimento


90. Requisitos[29]
a) É necessário que haja um enriquecimento
O enriquecimento consiste na obtenção de uma vantagem de carácter patrimonial, seja qual for a forma que essa vantagem revista, umas vezes a vantagem traduzir-se-á num aumento do activo patrimonial; outras, no uso ou consumo de coisa alheia ou no exercício de direito alheio, quando estes actos sejam susceptíveis de avaliação pecuniária, outras, ainda, na poupança de despesas.
b) A obrigação de restituir pressupõe, que o enriquecimento, contra o qual se reage, careça de causa justificativa – ou porque nunca a tenha tido ou porque, tendo-a inicialmente, entretanto a haja perdido.
A causa do enriquecimento varia consoante a natureza jurídica do acto que lhe serve de fonte.
Assim, sempre que o enriquecimento provenha de uma prestação, a sua causa é a relação jurídica que a prestação visa satisfazer.
Há, porém, muitos casos em que a situação de enriquecimento não provém de uma prestação do empobrecido ou de terceiro, nem de uma obrigação assumida por um outro, mas de um acto de intromissão do enriquecido em direitos ou bens jurídicos alheios ou de actos de outra natureza, porventura de actos puramente materiais.
c) A obrigação de restituir pressupõe, que o enriquecimento tenha sido obtido à custa de quem requerer a restituição
A correlação exigida por lei entre a situação dos dois sujeitos traduz-se, em regra, no facto de a vantagem patrimonial alcançada por um deles resultar do sacrifício económico correspondente suportado pelo outro. Ao enriquecimento injusto de uma pessoa corresponde o enriquecimento de outra.


91. Carácter subsidiário da obrigação de restituir
Num grande número de casos em que a deslocação patrimonial carece de causa justificativa, a lei faculta aos interessados meios específicos de reacção contra a dissolução.
Assim, quando a deslocação patrimonial assenta sobre um negócio jurídico e o negócio é nulo ou anulável, a própria declaração de nulidade ou anulação do acto devolve ao património de cada uma das partes os bens com que a outra se poderia enriquecer à sua custa (art. 289º/1 CC).
São diferentes, os efeitos das obrigações de restituir fundadas na invalidade do negócio e no enriquecimento sem causa (arts. 289º - 479º, 480º CC). À eficácia retroactiva da invalidade contrapõe-se o sentido não retroactivo, actualista, da correcção operada através do enriquecimento sem causa.


92. Consagração legal do princípio da subsidiariedade
Nos termos do art. 474º CC, a obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa, tem natureza subsidiária.
O carácter subsidiário da pretensão ao enriquecimento sem causa não significa, no entanto, que o respectivo regime só se aplique a casos omissos na lei, integradores da situação genericamente descrita no art. 473º CC. Há situações que a lei prevê e regula, remetendo expressamente para as normas do enriquecimento sem causa, por entender que a restituição nelas imposta se deve subordinar às regras próprias daquele instituto. Outras vezes, impondo a restituição, a lei não chega a dizer explicitamente em que termos se deve processar.


93. Repetição de indevido
Na fixação do regime do pagamento do indivíduo, a lei (art. 476º CC), distingue três hipóteses:
a) O cumprimento de obrigação inexistente (objectivamente indevido) – art. 476º CC;
b) O cumprimento de obrigação alheia, na convicção errónea de se tratar de dívida própria (subjectivamente indevido) – art. 477º CC;
c) O cumprimento de obrigação alheia, na convicção errónea de se estar vinculado, perante o devedor, ao cumprimento dela – art. 478º CC.
O art. 476º[30] CC, mostra que três requisitos são necessários, para que se possa exigir a repetição do indevido:
1) Que haja um acto de cumprimento, ou seja, uma prestação efectuada com a intenção de cumprir uma obrigação;
2) Que a obrigação não exista;
3) Que não haja sequer, por detrás do cumprimento um dever de ordem moral ou social, sancionada pela justiça que dê lugar a uma obrigação natural.


94. Objecto da obrigação de restituir (art. 479º CC)
O objecto é determinado em função de dois aspectos fundamentais:
1) Restituição medida pelo enriquecimento
O beneficiado não é obrigado a restituir todo o objecto da deslocação patrimonial operada. Deve restituir apenas aquilo com que efectivamente se acha enriquecido.
O locupletamento efectivo e actual que serve para determinar limite da obrigação de restituir (art. 479º/2, 480º CC), distingue-se da coisa ou valor obtido, num duplo aspecto.
Por um lado, no próprio momento da deslocação patrimonial, podem ser diferentes o valor objectivo da vantagem alcançada e o montante do efectivo enriquecimento que ela proporciona ao beneficiário.
Por outro lado, pode também haver diferença entre o enriquecimento do beneficiado à data da deslocação patrimonial e o enriquecimento actual referido no art. 480º CC.
2) …à custa do requerente
Além do limite baseado no enriquecimento (efectivo e actual) tem-se este limite fundado no empobrecimento do lesado
3) Agravamento da obrigação de restituir
O tratamento favorável do beneficiado, cessa logo, que o enriquecido seja citado para a restituição ou a partir do momento em que ele conheça a falta de causa do enriquecimento ou a falta do efeito que se pretendia obter com a prestação (art. 480º[31] CC).
O devedor passa então a responder pelo perecimento ou deterioração culposa da coisa, pelos frutos percipiendos que por sua culpa deixarem de ser produzidos e pelos juros legais das quantias a que o lesado tiver direito.


95. Prescrição do direito à restituição
O direito à restituição do que foi obtido sem justa causa está sujeito à prescrição de três anos, a contar da data em que lhe compete e da pessoa do responsável (art. 482º[32] CC).
O conhecimento do direito é sinónimo de conhecimento dos factos constitutivos do direito, com independência do conhecimento jurídico da existência do direito
O prazo de prescrição de três anos começa pois a contar quando o empobrecido sabe que se verificou a situação de que resultou o seu empobrecimento e o enriquecimento de outrem, conta a partir desse momento, se nesse momento ela já souber também quem é a pessoa do empobrecido.
Se ainda não souber, se não conhecer a identidade da pessoa que se enriqueceu, o prazo especial só começa a correr quando conhecer essa identidade.
Portanto, o início da contagem do prazo de três anos depende da verificação cumulativa destes dois conhecimentos:
- O conhecimento dos factos;
- O conhecimento da identidade da pessoa do enriquecido.
A partir daí inicia-se a contagem do prazo prescricional especial de três anos.
Mas, antes disso, começa a correr o prazo de vinte anos de prescrição ordinária. Esse prazo corre independentemente de pessoas do empobrecido. Esse prazo ordinário começa a correr a partir da deslocação patrimonial, não depende de conhecimento de nada por ninguém.

 

[29] Requisitos:
a) É necessário que haja um enriquecimento;
b) A obrigação de restituir pressupõe, que o enriquecimento, contra o qual se reage, careça de causa justificativa;
c) A obrigação de restituir pressupõe, que o enriquecimento tenha sido obtido à custa de quem requereu a restituição.
[30] 1 - Sem prejuízo do disposto acerca das obrigações naturais, o que for prestado com a intenção de cumprir uma obrigação pode ser repetido, se esta não existia no momento da prestação.
2 - A prestação feita a terceiro pode ser repetida pelo devedor enquanto não se tornar liberatória nos termos do artigo 770º.
3 - A prestação feita por erro desculpável antes do vencimento da obrigação só dá lugar à repetição daquilo com que o credor se enriqueceu por efeito do cumprimento antecipado.
[31] O enriquecido passa a responder também pelo perecimento ou deterioração culposa da coisa, pelos frutos que por sua culpa deixem de ser percebidos e pelos juros legais das quantias a que o empobrecido tiver direito, depois de se verificar algumas das seguintes circunstâncias:
a) Ter sido o enriquecido citado judicialmente para a restituição;
b) Ter ele conhecimento da falta de causa do seu enriquecimento ou da falta do efeito que se pretendia obter com a prestação.
[32] O direito à prescrição por enriquecimento prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o credor teve conhecimento do direito que lhe compete e da pessoa do responsável, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do enriquecimento.

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