F - Evolução histórica do direito da família
12. A invenção do Direito Matrimonial (séc. XII e XIII)
Por “invenção” do Direito matrimonial quer-se significar a transformação em normas jurídicas estaduais, em Direito aceite e aplicado pelo “Estado”, das normas eclesiásticas sobre o casamento que viam neste um vínculo indissolúvel, perpétuo, monogâmico, heterossexual e de carácter sacramental. Sobretudo a afirmação “jurídico-estadual” da sua perpetuidade. “Invenção” que se enraizou na competência exclusiva da jurisdição eclesiástica sobre o matrimónio verificada a partir do séc. XI.
O séc. XIII é o da ordem: política, social, profissional, religiosa. Ordem querida por Deus, e mantida pelo Papa, detentor das “duas espadas”, do poder espiritual e temporal.
O séc. XIII, os ideólogos compraziam-se em descrever a ordem: o inferior subordinado ao superior; o “iunior” sujeito ao “senior”; os ofícios agrupados em corporações; tal como Deus-pai, a Virgem Maria e Cristo, também o casal cristão e os filhos, o casamento disciplinado as paixões, e organizando a procriação.
13. O trabalho complementar: a reelaboração dos fins do casamento
Na época em que os canonistas impõem à sociedade a “sua” instituição matrimonial, havia que a justificar socialmente. Pouco a pouco abandona-se a severidade dos padres da Igreja para quem o casamento, inquinado pela concupiscência, vizinho próximo do pecado. Através da procriação, primeiro, do auxílio mútuo dos cônjuges e do remédio da concupiscência, depois o casamento aparece justificado, correspondendo às necessidades permanentes da sociedade e dos próprios cônjuges. Mas foi este um processo longo e tardio, talvez só nos nossos dias completo. Desvalorizando perante a “ordem do ministério”, o sacramento do matrimónio tem sempre, próximas, as suas raízes de simples “remédio” tolerado.
Santo Agostinho via em três “bens”: “proles”, “fides” e “sacramentum”, a razão determinante da instituição do matrimónio por Cristo. “Proles” significa a procriação e a educação dos filhos; “fides”, a fidelidade que se devem os cônjuges; “sacramentum”, o vínculo indissolúvel entre os cônjuges, que simboliza a ligação entre Cristo e a Igreja.
O uso do casamento deve estar sempre subordinado à geração, sendo a procura do prazer um pecado venial. É assim que o casamento é um “remédio da enfermidade”, permitindo o uso ordenado dos prazeres da carne.
14. O matrimónio como sacramento
Os teólogos e canonistas sempre qualificaram o matrimónio como sacramento.
Contudo, até meados do séc. XII, fundamentalmente até à obra de Pedro Lombardo, a incerteza sobre o conteúdo da noção “sacramentum”, tomado este em sentido muito lato, tornava pouco precisa a qualificação do matrimónio como um sacramento. A partir do séc. XII, com a precisão do conceito de sacramento, as incertezas acabaram.
Santo Alberto Magno considera o matrimónio perfeito pela simples troca dos consentimentos. Figurando a união de Cristo com a sua Igreja, através da união dos esposos, confere a graça. É pois, um sacramento. Pontos de vista que são seguidos por S. Tomás de Aquino.