E - Direitos do Consumidor e Defesa da Concorrência
27. Auxílios do Estado
São fortemente limitados pelo Direito Comunitário da Concorrência, porque se pretende ser um factor de desequilíbrio potencial do mercado. No âmbito da legislação interna, o art. 11º do DL 371/93, estabelece que os auxílios prestados pelo Estado ou por qualquer outra entidade pública não poderão afectar a concorrência de modo significativo, no entanto a mesma disposição contempla algumas excepções, como é o caso das indemnizações compensatórias pela prestação de um serviço público ou dos benefícios concedidos ao abrigo de programas específicos de incentivo.
28. A concentração de empresas
É uma matéria controlada pelo Estado através da notificação prévia prevista no art. 7º/1 do DL 371/93, este mecanismo só é aplicável nas operações de concentração que preencham uma das seguintes condições:
1. Criação ou reforço de uma quota nacional igual ou superior a 30% do mercado;
2. Volume de negócios envolvidos igual ou superior a 30 milhões de contos no mercado nacional no exercício anterior. O art. 9º define concentração de empresas tendo em conta três situações diferenciadas:
a) A fusão de duas ou mais empresas dotadas de personalidade jurídica independentemente e que se transformam numa única empresa;
b) Quando duas ou mais pessoas adquirem o controlo de empresas concorrentes;
c) Quando é criada uma nova empresa que vai actuar na mesma área de negócio das pessoas que presidem à sua criação.
A Defesa da Concorrência, instrumento fundamental da Política Económica, encontra-se regulada, ao nível do ordenamento jurídico português, desde o DL 422/83 de 3 de Dezembro.
Segundo o próprio legislador, este diploma, essencial para a organização económica, prosseguia um duplo objectivo: por um lado, garantir aos consumidores uma escolha diversificada de bens e serviços, nas melhores condições de qualidade e preço; por outro, estimular os agentes económicos a racionalizar ao máximo a produção e distribuição dos bens e serviços, adaptando-se à inovação tecnológica.
O diploma avançava ainda com o conceito de grupo de empresas, considerando como o “conjunto de empresas que, embora juridicamente distintas, se comportam concertadamente no mercado”, ou seja, com uma estratégia comum, criada sobretudo por vínculos de carácter financeiro ou contratual.
A tutela da concorrência é uma atitude do Estado destinada a preservar o equilíbrio de um sistema que conhece distorções e no qual a preponderância de um agente económico conduz com facilidade ao desvio face à lei da oferta e da procura. Nessa medida, tendo em conta as alterações do mercado, bem como a própria adesão de Portugal a um espaço económico com regras próprias, foi necessário criar um novo ordenamento para esta matéria, constante dos Decretos-lei 370/93 e 371/93, de 29 de Outubro.
29. As práticas proibidas
O DL 370/93, alterado pelo DL 140/98 de 16 de Março, o qual sobre as práticas individuais restritivas do comércio. Este DL 370/93, prevê os seguintes comportamentos individuais de agentes económicos considerados contrários à livre concorrência:
a) Aplicação de preços ou de condições de venda discriminatórios;
b) Inexistência de tabelas de preços com as respectivas condições de venda;
c) Venda com prejuízo, que pode ter várias justificações, as quais afastam a aplicação de sanções;
d) Recusa de venda de bens ou prestações de serviços, também neste caso possibilitando a apresentação de diversas causas justificativas.
Cabe à Inspecção-geral das Actividades Económicas a fiscalização do disposto neste diploma, bem como a instrução dos respectivos processos, embora a sua apreciação seja feita por uma Comissão criada pelo DL 28/84 de 20 de Janeiro.
Já o DL 371/93, visa contribuir para a formação do preço através da relação estabelecida livremente entre a oferta e a procura, mediante o franqueamento do acesso ao mercado, o equilíbrio entre os agentes económicos e a salvaguarda dos direitos dos consumidores.
O actual regime jurídico contempla a Defesa da Concorrência, a concentração empresarial e os auxílios do Estado, na tentativa de criar uma moldura abrangente e capaz de aplicar os principais instrumentos da política comunitária nesta matéria.
De forma simplista, pode-se dizer que o DL 371/93 distingue entre práticas proibidas (com eventual causa justificativa) e práticas controladas (caso da concentração de empresas).
Os termos da previsão do art. 2º, serão proibidos os acordos e práticas concertadas entre empresas, bem como as decisões de associações de empresas, independentemente da forma utilizada, desde que tenham por objecto ou com efeito de impedir, falsear ou limitar a concorrência no mercado nacional (no seu todo ou em parte).
O art. 3º prevê a proibição de exploração abusiva de posição dominante no mercado, desde que este comportamento tenha por objecto ou como efeito a lesão da concorrência.
A lista de comportamentos proibidos contida no art. 2º/1 será considerada prática abusiva se for desempenhada por empresas colocadas em posição dominante.
A figura do balanço económico, prevista no art. 5º, consiste na admissibilidade de justificação para as práticas restritivas da concorrência que contribuíam para melhorar a produção ou a distribuição de bens ou serviços, ou para promover o desenvolvimento técnico ou económico, desde que observem três condições comulativas:
a) Uma parte equitativa do benefício auferido reverter a favor dos utilizadores;
b) Não sejam impostas restrições supérfluas para atingir aqueles objectivos;
c) Não seja eliminada a concorrência numa parte substancial do mercado dos bens ou serviços em causa.
30. Procedimento em matéria de controlo de concentração
O art. 29º e segs. do DL 371/93, vem estabelecer um procedimento aplicável para a notificação prévia das operações de concentração exigida nos termos do art. 7º/1. A notificação tem que incluir informações rigorosas sobre as empresas intervenientes na operação e é entregue junto da Direcção Geral do Comércio e da Concorrência (e preços). No prazo de quarenta dias aquela Direcção Geral, tem que instruir o respectivo processo e remetê-lo ao Ministro competente no prazo de cinquenta dias, contados da data de recepção de toda a documentação na mesma Direcção Geral, o Ministro tem que pronunciar-se, mas o art. 32º, prevê a possibilidade de ser remetido ao Conselho da Concorrência para parecer. Este facto tem de ser comunicado aos interessados pelo que se nada lhes for dito, estaremos perante uma decisão de não oposição.
O Conselho de Concorrência tem trinta dias para devolver ao Ministro o processo em apreciação acompanhado do respectivo parecer sobre a operação de concentração e os seus efeitos sobre o mercado.
No prazo de quinze dias contados do reconhecimento desse parecer, o Ministro responsável tomará uma de três decisões:
1. Não se opõe à concentração;
2. Estabelece condições para a realização da concentração;
3. Proíbe a concentração.
Nos termos do art. 35º, os interessados podem recorrer para o Supremo Tribunal Administrativo.
31. O Controlo da concentração
Da concentração de empresas á outro elemento novo a destacar no regime da concorrência, por corresponder a uma prevenção jurídica fortemente requerida pela disciplina comunitária, tendo em conta a sua importância para a génese das situações de posição dominante e, em extremo, de monopólios privados de facto.
O novo regime geral da defesa e promoção da concorrência corresponde ao alargamento do mercado e, através de divisão sistemática entre práticas individuais e práticas concertadas restritivas do bom funcionamento da economia, tende a acentuar a prevenção das perturbações e a gravar as sanções às empresas infractoras.
32. A defesa do consumidor
Tem um enquadramento legal próprio desde 1981, a qual remete para a recentemente criada Lei 24/96, para esta lei o consumidor é todo aquele que compre bens ou serviços para seu uso privado, desde que a pessoa do vendedor seja alguém que exerça profissionalmente essa actividade. A estrutura deste diploma compreende o estacionamento claro dos Direitos dos Consumidores e o estatuto jurídico das Associações de Defesa do Consumidor, e ainda a indicação dos órgãos públicos intervenientes, nesta matéria dos quais se destaca o Instituto do Consumidor. Os direitos enunciados no art. 3º, podem ser enquadrados na prática económica do mercado na atitude do Estado face aos consumidores e na protecção jurídica destes em especial por via de uma justiça acessível e pronta.
A defesa do consumidor, assenta numa vasta consagração constitucional contida, essencialmente, no art. 60º, que insere os direitos dos consumidores no Plano dos direitos e deveres fundamentais dos cidadãos em matéria económica, no art. 81º-h, que faz recair sobre o Estado a obrigação de garantir a defesa dos interesses e dos direitos dos consumidores e, por fim, ao nível das Políticas Económicas, em particular enquanto objectivo da Política Comercial, no art. 99º-e, funcionando como linha de orientação a preservar na sua elaboração.
O regime legal vigente encontra-se na Lei 24/96 de 31 de Julho. A definição de consumidor mantém-se o enquadramento que exclui à partida todas as situações de compra e venda entre os particulares, bem como as compras para revenda ou para uso nas actividades agrícolas, comerciais ou industriais.
Quanto ao elenco de Direitos do Consumidor constante do art. 3º, há a dizer o seguinte:
a) Direito a qualidade dos bens e serviços;
b) Direito à protecção da saúde e à segurança contra as práticas desleais ou irregulares de publicação ou fornecimento de bens ou serviços;
c) Direito à formação e à educação para o consumo;
d) Direito à informação para o consumo;
e) Direito à protecção dos interesses económicos;
f) Direito à prevenção e acção inibitória;
g) Direito à reparação de danos;
h) Direito à protecção jurídica e direito a uma justiça acessível e pronta;
i) Direito de participação, por via representativa, na definição legal ou administrativa dos seus direitos e interesses, por parte dos consumidores.
A adopção de um regime de mercado não liberta o Estado de preocupações face à economia, antes exigindo funcionamento (Defesa da Concorrência), como para proteger a parte mais vulnerável no processo produtivo (direitos dos consumidores e regulamentação da publicidade); daí a preocupação de estabelecer órgãos de mediação e consulta, de que é exemplo o Conselho Nacional do Consumo, previsto no art., 22º da Lei 26/94, na qualidade de “órgão independente de consulta e acção pedagógica e preventiva, exercendo a sua acção em todas as matérias relacionadas como interesse dos consumidores”; este órgão deve protagonizar um trabalho permanente de diálogo entre a Administração e a Sociedade, com vista a desenvolver a protecção dos direitos dos consumidores.
33. A Inspecção-geral das Actividades Económicas
É um órgão integrado na Administração Pública que tem por função fiscalizar e promover o cumprimento das leis que regule a actividade económica.
A respectiva Lei Orgânica (Decreto-lei n.º 266-A/95 de 19 de Outubro, ver em conjunto com o Decreto-lei 28/84, de 20 de Janeiro, texto rectificado no Diário da República, I Série, 2º suplemento, de 31 de Março de 1984, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei 6/95 de 17 de Janeiro - Regime das Infracções Antieconómicas Contra a Saúde Pública: e com o Decreto-lei 214/84 de 3 de Julho, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei 345/84 de 29 de Outubro - estabelece regras de funcionamento da Comissão de Aplicação de Coimas em Matéria Económica), confere-lhe natureza policial o que lhe permite investigar infracções em matéria económica, tanto de nível contra-ordenacional como de nível criminal. A IGAE tutela por isso os interesses dos consumidores e dos agentes económicos em geral. Esta instituição produz uma actividade relevante em termos do controlo económico realizando também a Política Comercial prevista no art. 99º CRP, podemos dizer por isso que a IGAE se situa no âmbito do Direito Penal Económico.
34. A negociação: Os contratos económicos e a concertação social
Os contratos económicos são pois, um meio utilizado pelo Estado para aplicar as suas políticas, prescindindo de recorrer a actos administrativos unilaterais; os agentes económicos, por seu lado, recebem uma contrapartida, resultante da sua colaboração.
Quanto à concertação propriamente dita, surge muitas vezes aliada aos actos de planeamento da economia, abrangendo aspectos de foro económico e social.
Em Portugal, existe um órgão constitucional. O Conselho Económico e Social, no âmbito do qual funciona a Comissão de Concertação; como é típico destas estruturas consultivas, é amplamente participado, com natural relevo para as organizações sindicais e patronais.