top of page

A - INTRODUÇÃO

 

1. Direito Penal

Conjunto de normas jurídicas que associam factos penalmente relevantes uma determinada consequência jurídica, uma sanção jurídica ou, conjunto de normas jurídicas que fazem corresponder a uma descrição de um determinado comportamento uma determinada consequência jurídica desfavorável.

A esses factos penalmente relevantes correspondem determinadas sanções jurídico-penais, que são basicamente:

- As penas, e as principiais são:

* Prisão;

* Multa.

- As medidas penais, e as principiais são:

* Medidas de segurança;

* Medidas de correcção.

a) Medidas de segurança

Têm um carácter essencialmente preventivo, embora sejam sempre pós-delituais e são baseadas na perigosidade do delinquente.

No âmbito do Direito Penal vigora o princípio da culpa que significa que toda a pena tem como suporte axiológico normativo uma culpa concreta; a culpa é simultaneamente o limite da medida da pena.

Ou seja, quanto mais culpa o indivíduo revelar na prática de um facto criminoso, maior será a pena, quanto menor a culpa menor será a pena.

O fundamento para a aplicação de uma medida de segurança, não pode ser a culpa, mas sim a perigosidade, ou seja, justifica-se a imposição daquela medida de segurança quando há suspeita de que aquele indivíduo que cometeu aquele facto penalmente relevante volte a cometer novo ilícito, de gravidade semelhante.

b) Medidas de correcção

São medidas (penais) que se aplicam a jovens delinquentes.

A partir dos 16 anos, o indivíduo tem plena capacidade de culpa e sobre ele pode recair uma pena: pena de prisão ou pena de multa. Antes dos 16 anos, o indivíduo é inimputável.

c) Penas

Sanção característica do Direito Penal. Prevista e regulada nos arts. 40º segs. CP.

A pena de prisão tem um limite mínimo de um mês e um limite máximo de 20 anos podendo ir até aos 25 anos em determinados casos (art. 41º CP).

A pena de multa tem um limite mínimo de 10 dias e um limite máximo de 360 dias (art. 47º CP).

A pena de prisão distingue-se da pena de multa:

- A pena de prisão é uma pena privativa da liberdade, em que o indivíduo é encarcerado num determinado estabelecimento prisional onde cumpre a pena, vendo a sua liberdade de movimentação coactada;

- A pena de multa é uma pena de natureza essencialmente pecuniária, se o juiz condenar alguém pela prática de um crime com uma pena de multa e esta não paga, ela tem a virtualidade de ser convertível em prisão.

2. Definição estrutural de Direito Penal

Direito Penal é composto por um conjunto de normas jurídicas com uma determinada estrutura. Essa estrutura é a descrição de um facto, de um comportamento humano que é considerado crime ou contravenção, a que corresponde uma sanção jurídico-penal[1].

Estrutura da norma penal:

- A descrição de um facto – previsão;

- A sanção jurídica que corresponde à prática desse facto – estatuição.

Mas nem sempre as incriminações ou crimes estão descritos pressupondo da parte do agente, um comportamento activo; em Direito Penal são crimes não só determinadas acções, como também determinadas omissões.

Pune-se não a actividade, mas precisamente o “non facere”, uma omissão, uma inactividade, quando a lei obrigava, naquelas circunstâncias, a que a pessoa actuasse. A norma tem uma estrutura decomposta numa previsão e numa estatuição.

- A estrutura das normas penais insertas na parte especial tem, de um modo geral, esta bipartição entre uma previsão e uma estatuição;

- As normas da parte geral permitem de alguma forma encontrar princípios e preceitos que contemplam o que está na parte especial.

 

3. Crítica há definição estrutural da norma penal

Esta definição estrutural do Direito Penal não nos resolve o problema de saber se, em determinados campos em que também são aplicadas consequências jurídicas desfavoráveis a pessoas que cometem determinados factos relevantes, se isso é ou não Direito Penal, poderá não ser: poderá ser por hipótese direito disciplinar, ilícito da mera ordenação social; ilícito das contravenções (coimas) etc.

Também nestes casos é cominada uma consequência jurídica desfavorável (uma estatuição) para quem incorre num determinado facto previsto.

O objecto do Direito Penal são os factos penalmente relevantes, sendo os de maior importância os crimes.

 

4. Definição formal e material de crime

Formalmente pode-se dizer que o crime é uma acção ou um facto típico, ilícito e culposo.

Portanto, os crimes principais encontram-se na parte especial do CP. Mas encontram-se muitos crimes tipificados em outros diplomas legislativos: Decreto-lei[2], leis.

Materialmente, crime é todo o comportamento humano que lesa ou ameaça de lesão (põe em perigo) bens jurídicos fundamentais.

Existe um princípio basilar e que dá consistência à criminalização de comportamentos que é o princípio da subsidiariedade do Direito Penal.

O Direito Penal ao intervir, só deve emprestar a sua tutela, só está legitimada a intervir para tutelar determinados bens de agressões humanas quando essa tutela não puder ser eficazmente dada através de outros quadros sancionatórios existentes no ordenamento jurídico. Ou seja, quando do direito civil, do direito administrativo, não forem suficientemente eficazes para acautelar esses bens jurídicos que as normas de Direito Penal procurem acautelar.

Bens jurídicos são valores da ordem ideal que o legislador considera, muitas vezes por opção de para política, outras por opção de política penal ou política criminal, procurando dar tutela jurídica. São bens jurídicos:

- Vida;

- Integridade física;

- Honra;

- Liberdade;

- Propriedade;

- Património em geral;

- Liberdade de movimentação;

- Liberdade de decisão; etc.

Por detrás de cada tipo legal de crime, encontram-se sempre a necessidade de tutelar um ou mais bens jurídicos.

Não é legítima a criação de um comportamento criminoso, a criação de uma incriminação, sem que por detrás dessa incriminação se tentem proteger bens jurídicos fundamentais.

Formalmente o Direito Penal está legitimado pelas normas constitucionais, mormente o art. 18º CRP, a Constituição aponta determinados critérios que o legislador ordinário em matéria penal não pode ultrapassar. As normas penais têm de estar em harmonia com as orientações constitucionais.

Mas, não é o legislador penal que cria o bem jurídico. O bem já existe porque é um valor de ordem ideal, de ordem moral. Simplesmente o legislador, ao atribuir-lhe tutela penal, transforma-o em bem jurídico.

A intervenção do Direito Penal por força do princípio da subsidiariedade só se justifica quando seja para acautelar lesões ou ameaças de lesões de bens jurídicos fundamentais.

 

5. Direito Penal no quadro das ciências penais

O Direito Penal é composto por um conjunto de normas jurídicas que têm a virtualidade de associar a factos penalmente relevantes – os crimes e as contravenções – determinadas consequências jurídico-penais.

- Formalmente, o Direito Penal é legitimado pelas próprias normas constitucionais e a visão constitucional do funcionamento do Estado e da sociedade é reflectida depois pelo legislador em sede de Direito Penal;

- Materialmente, aquilo que legitima o Direito Penal é a própria manutenção do Estado e da própria sociedade.

Portanto, o Direito Penal só deve intervir quando e onde se torne necessário para acautelar a inquebrantibilidade social.

Saber quais os bens estes valores da ordem moral e ideal que devem carecer de disciplina jurídica e de tutela penal, pode fazer-se através de duas maneiras:

1) Através de um processo intra-sistemático, ou seja, inerente ao sistema: averiguar quais são as incriminações constantes de legislação penal, quer da parte especial do Código Penal, quer de legislação penal extravagante ou avulsa; verificar que comportamento é que o legislador penal, face ao direito vigente, considera como tal; saber depois de por detrás dessas incriminações se encontram sempre bens jurídicos que o legislador pretende tutelar.

2) Através de um plano sistemático crítico: indagam que valores, que bens, carecem de tutela penal.

O Direito Penal é talvez o ramo de direito que mais próximo se encontra do ordenamento moral. Muitos comportamentos que são considerados como criminosos, não deixam de reflectir uma certa carga moral.

 

6. Princípio da subsidiariedade do Direito Penal

O Direito Penal só deve intervir quando a tutela conferida pelos outros ramos do ordenamento jurídico não for suficientemente eficaz para acautelar a manutenção desses bens considerados vitais ou fundamentais à existência do próprio Estado e da sociedade.

A este carácter subsidiário do Direito Penal, que se resume dizendo que o Direito Penal intervém como ultima “ratio” no quadro do ordenamento jurídico instrumental, deve opor-se um outro princípio que é o princípio da fragmentariedade do Direito Penal, o Direito Penal não deve intervir para acautelar lesões a todos e quaisquer bens, mas tão só àqueles bens fundamentais, essenciais e necessários para acautelar a inquebrantibilidade social.

O carácter subsidiário e fragmentário do Direito Penal deve ser também analisado em consonância com outro princípio fundamental que é o princípio da proporcionalidade.

Tal como Gallas dizia: “não se devem disparar canhões contra pardais, mesmo que seja a única arma de que disponhamos”.

Significa isto que há que medir em termos de proporção, em termos de grandeza, a necessidade que há de tutelar um bem fundamental, sendo certo que a intervenção do Direito Penal, por força das sanções jurídicas que lhe são características, colide com o direito de liberdade que é um direito fundamental do cidadão.

O Direito Penal só deve intervir quando a sua tutela é necessária e quando se revela útil, quando tem alguma eficácia.

 

7. Âmbito e disciplina do Direito Penal

Segundo um critério que separa entre aplicação, criação e execução dos preceitos de natureza penal, pode-se distinguir entre:

- Direito Penal material ou substantivo;

- Direito Penal adjectivo, formal ou Direito Processual Penal;

- Direito Penal da execução, também designado por Direito Penal executório ou direito da execução penal.

A dogmática jurídico-penal, ou dogmática penal, é uma ciência normativa que tem como fundamento e limite à lei positivada, a lei vigente. Neste caso, a lei penal.

A dogmática parte da elaboração de conceitos que arruma num edifício lógico e que vem permitir uma aplicação certa, segura e uniforme da lei penal, ou seja:

- Afirma-se que um crime é uma acção ou um facto típico, ilícito, culposo e punível é obra dogmática;

- Afirmar-se, por exemplo, que um facto ilícito é um facto típico não justificado, é também obra da dogmática jurídico-penal.

 

8. O que é a culpa?

É um juízo de censura formulado pela ordem jurídica a um determinado agente.

Censura-se ao agente o facto de ele ter decidido pelo ilícito, o facto de ele ter cometido um crime, quando podia e devia ter-se decidido diferentemente, ter-se decidido de harmonia com o direito.

Dentro do âmbito e delimitação do Direito Penal, pode-se distinguir três conceitos:

1) Crimes;

2) Contravenções;

3) Contra-ordenações.

 

9. Principais diferenças de regime entre contravenção e crime

Nas contravenções não se pune nunca a tentativa, diferentemente do que acontece no âmbito dos crimes por força do preceituado nos art. 22º e 23º CP, ou seja, não há facto contravencional tentado, enquanto que há responsabilidade por crimes praticados na forma tentada.

Não se pune a cumplicidade no âmbito das contravenções; ao passo que os cúmplices dos crimes são punidos com as penas fixadas para os autores, especialmente atenuadas, conforme preceitua o art. 27º/2 CP.

Quanto aos prazos de prescrição do procedimento criminal, tanto maiores são quanto maiores forem as penas.

Tendencialmente é verdade que as contravenções são menos graves que os crimes; por força do princípio da proporcionalidade, que é também um princípio de política penal, a facto menos graves devem corresponder sanções menos graves; onde, as contravenções são menos sancionadas que os crimes; logo, se os prazos de prescrição do procedimento criminal são mais amplos consoante maiores forem as penas, então se pode dizer que os prazos de prescrição do procedimento criminal são mais curtos no âmbito das contravenções do que no âmbito dos crimes (art. 117º CP).

É admissível a extradição em matéria de crime; não se admite extradição se se tratar de uma contravenção.

No âmbito dos crimes, só há responsabilidade criminal se os factos forem praticados dolosamente; ressalva-se a excepção do art. 13º CP, e a responsabilização criminal por facto negligente, quando a lei expressamente o disser.

Nas contravenções é indiferente a responsabilização fundada em facto doloso ou facto negligente.

 

10. Semelhanças entre ilícito penal e o ilícito de mera ordenação social

Ambos os ilícitos tentam proteger valores dignos de protecção legal.

O ilícito penal empresta, efectivamente, a protecção jurídico-penal, e o ilícito de mera ordenação social empresta uma tutela administrativa.

Para prevenir violações a esses interesses que carecem de protecção legal, ambos os ilícitos impõem aos infractores consequências jurídicas desfavoráveis.

Por outro lado, o crime tem de ser um facto típico. Também a contra ordenação tem de ser tipificada na lei; conforme a definição do art. 1º CP.

O crime tem de ser um facto ilícito, contrário à lei. Por força do disposto no art. 1º DL 433/82, também a contra-ordenação.

O crime é um facto censurável e a contra-ordenação também.

 

11. Diferenças entre ilícito penal e ilícito de mera ordenação social

Os seus fins:

Âmbito de aplicação, enquanto que no âmbito do ilícito penal se exige sempre a intervenção judicial, não se pode aplicar nenhuma sanção jurídico-penal sem a intervenção dos tribunais.

Quem aplica as coimas no ilícito da mera ordenação social é a administração; só em caso de não conformação é que poderá haver recurso para os tribunais comuns[3].

As sanções dos ilícitos são diferentes:

- A sanção característica do ilícito penal é a pena que assume duas modalidades:

* Pena de multa, de natureza essencialmente pecuniária, mas que, quando não paga, pode ser convertida em pena de prisão;

* Pena de prisão, que consiste numa privação da liberdade humana.

- A sanção do ilícito de mera ordenação social é a coima, que tem uma natureza pecuniária e que, quando não paga, não pode ser convertida em prisão.

No ilícito penal é possível a prisão preventiva. No ilícito da mera ordenação social, não é admissível a prisão preventiva; é, contudo possível a detenção por 24 horas para identificação do suspeito.

No âmbito do ilícito penal, por regra e por força do art. 11º CP, vigora o princípio da personalidade, salvo disposição em contrário, só as pessoas singulares são susceptíveis de responsabilidade criminal. Diferentemente sucede no ilícito da mera ordenação social, em que as pessoas colectivas podem ser sancionadas (art. 7º DL 433º/82). Não há impedimento conceitual à aplicação de coimas a pessoas colectivas, diferentemente do que sucede enquanto regra no âmbito do Direito Penal.

 

12. Direito Penal geral e Direito Penal especial

A base da distinção encontra-se no art. 8º CP.

Quando se fala no artigo em Direito Penal militar e Direito Penal da marinha mercante, isso são fundamentalmente leis penais específicas, ou seja, leis que têm a ver com a categoria funcional de determinadas pessoas e que valem, portanto, dentro de determinados limites. Aplicam-se, como os nomes indicam, aos agentes que detêm essas qualidades.

Portanto, as disposições deste código penal aplicam-se não só ao Direito Penal, como à restante legislação especial.

Significa, pois que o código penal está dividido em duas partes:

- Uma parte geral, que vai até o art. 130º CP, inclusive;

- Uma parte especial, que vai do art. 131º CP, em diante.

Há leis de carácter pessoal[4] que saíram posteriormente à feitura e à elaboração do código penal.

Leis há que ainda não estão suficientemente maduras ou experimentadas, para passarem a integrar imediatamente a parte especial do código penal, e consequentemente não têm aquele carácter de estabilidade que devem ter as normas constantes de um código.

 

[1] Vulgarmente uma pena.

[2] Mediante autorização da Assembleia da República.

[3] E não tribunais administrativos.

[4] Direito Penal especial.
 

bottom of page